quarta-feira, 5 de março de 2008

Pessoas versus Papéis e Circunstâncias

Olá,

É comum termos pessoas a quem confiamos totalmente e outras das quais desconfiamos sem pestanejar. Refletir sobre o que nos leva a agir dessa maneira e sobre quando e até onde devemos acreditar em nossa intuição é o que pretendo fazer nesse artigo.

Se você está sentado em uma cadeira confortável, em frente a uma bela mesa e com algumas regalias em relação à maioria, é provável que acredite ter razoável capacidade de relacionamento com outras pessoas. Como para se relacionar bem com as pessoas é preciso conhecê-las, assumo que você se considera capaz de perceber intenções e comportamentos e partirei dessa premissa.

Aqui faço uma ressalva para o seu auto-desenvolvimento. Ser bem sucedido não é sinônimo de saber se relacionar com as pessoas tampouco de conhecê-las verdadeiramente. Se você quer saber o quanto é capaz de se relacionar com os outros, esqueça o que você pensa de si mesmo e procure saber o que os outros pensam de você, principalmente os colegas e os subordinados. Existem várias maneiras de fazer isso e um exemplo são os famosos instrumentos de avaliação 360.

Retornando ao ponto, se partirmos do pressuposto que você tem habilidade para identificar se uma pessoa é confiável ou não, então você saberá quando confiar e quando desconfiar dela, certo? A experiência mostra que não é bem assim e por vários motivos.

Em primeiro lugar, no mundo profissional recebemos a missão de defender interesses de nossas organizações. Essa missão nem sempre está alinhada com a maneira como pensamos ou como decidiríamos se fôssemos totalmente independentes. Cada profissional defende os interesses de sua organização e se comporta, ainda que alinhado com seus valores e princípios, de maneira a otimizar os interesses da parte que representa.

Não reconhecer que existem conflitos e alinhamento de interesses nas relações comerciais é simplificar demais o relacionamento, o que pode levar a situações difíceis. Por mais confiáveis que as pessoas sejam, devemos reconhecer que seus objetivos profissionais nem sempre estarão alinhados com a amizade ou a afinidade que temos com essas pessoas. Por outro lado, por menos confiáveis que as pessoas nos pareçam, interesses profissionais comuns podem ser suficientes para que uma transação justa e boa para as duas partes ocorra, mesmo sem haver qualquer tipo de afinidade.

É necessário separar o modo como as pessoas funcionam de seus papéis nas organizações. Por mais que certas ações pareçam atitudes pouco confiáveis, é necessário filtrar a influência das circunstâncias nas atitudes das pessoas sob pena de sermos extremamente injustos e demasiadamente implacáveis.

A sabedoria popular utiliza um ditado para dizer que a ocasião faz o ladrão. Essa afirmação traz um certo desconforto a qualquer um que tenha como norma seguir os seus valores, mas a verdade é que as circunstâncias têm uma influência muito grande sobre a forma como nos comportamos. Elas funcionam com as forças do vento, que afetam a velocidade e a direção de um avião em movimento. Apesar da enorme potência de suas turbinas e da alta tecnologia de navegação, qualquer avião está sujeito a acidentes por conta delas. Assim como com os aviões, estamos sujeitos às forças das circunstâncias e aos efeitos nocivos e benéficos que elas trazem.

Entender a grande força que as circunstâncias possuem não significa aceitar que elas devem definir nossos comportamentos. Assim como no caso dos aviões, quanto mais forte for o compromisso com nossos valores e mais habilidade tivermos para enfrentar situações difíceis, mais próximos estaremos do comportamento ideal. No entanto, é fundamental compreender que somos falíveis e que temos limites em todos os aspectos de nossa vida.

Saber separar a essência das pessoas das circunstâncias que a cercam não é tarefa fácil. Ao longo da vida iremos cometer vários erros de julgamento e não há nada de mal nesse fato.

Ao mesmo tempo, preocupar-se com essa realidade e trabalhar no sentido de lidar melhor com essa dualidade é um dos exercícios mais efetivos de crescimento humano e profissional, pois nos ajuda a reconhecer que a virtude e a fraqueza está presente em todos nós; que não somos perfeitos e, portanto, estamos sujeitos a falhar e a decepcionar nossos amigos; que existem coisas que estão além do nosso controle; e que julgar traz mais malefícios do que benefícios.

Se você tiver comentários sobre esse tema, não deixe de enviar um e-mail para mim. Meu endereço é paulo.pinho@uol.com.br

PP

Nenhum comentário:

Postar um comentário