sábado, 20 de dezembro de 2008

Olhando a crise de forma diferente

Olá,


Hoje pela manhã me dei conta de que não ainda não comentei os efeitos da crise na carreira e na vida pessoal dos executivos. É certo que no Brasil estamos prevendo um impacto menor do que em outros países, mas mesmo assim me chamou a atenção o fato de não ter dado atenção a um evento tão presente no dia a dia das discussões dos executivos.


Minha primeira avaliação foi de que não concentrei minhas atenções no assunto por não ter sido verdadeiramente impactado por ela. Depois, com um pouco de reflexão concluí que essa afirmação estava longe de ser verdadeira. Como a maioria dos executivos acima dos quarenta anos, possuo parte de minhas reservas financeiras aplicadas no mercado de renda variável. Não dá para dizer que perder 40% do valor dessas aplicações é um impacto desprezível.


Mesmo com a constatação de que fui realmente impactado pela crise, a verdade é que continuo não me sentindo preocupado com o futuro. Ao contrário, tenho a esperança realista de que a perda percebida será recuperada em 2 ou 3 anos e estou avaliando seriamente a possibilidade de aumentar meus investimentos no mercado de ações.


De onde vem tanta esperança e tranqüilidade? Acho que vem de minha nova maneira de viver e gostaria de contar um pouco para vocês as mudanças pelas quais tenho passado nos últimos quatro anos. Talvez essa informação possa ajudar alguns de vocês a procurarem um pouco mais de paz e tranqüilidade.


Minha carreira como executivo começou há pouco mais de 20 anos, quando fui convidado para a minha primeira posição de gerência. Naquela época, com cerca de 26 anos, tomei a oportunidade como única e me entreguei de corpo e alma ao papel de executivo.


Em menos de 4 anos me tornei diretor de uma importante empresa nacional da área de tecnologia, ainda durante o período de reserva de mercado. Sem dúvida, uma carreira de sucesso em um mercado altamente competitivo. Mas o sucesso como executivo não veio sem custo...


Fui me tornando um cara durão, extremamente orientado a resultados, daqueles que pouco comemorava e sempre estava insatisfeito com o estado das coisas. Apesar de em geral ser admirado como líder, era muitas vezes odiado pela maneira direta e brutalmente franca com que colocava minhas opiniões sobre as pessoas e as situações. Sem dúvida conseguia fazer as pessoas produzirem muito, mas hoje tenho a consciência de que poderia ter conseguido o mesmo ou mais um pouco sem causar tanto desconforto e sofrimento.


Na área da saúde tive meus maiores prejuízos. Engordei mais de 20Kg em cerca de 10 anos, tive alguns sustos com dores no peito e sou usuário de remédios para a pressão arterial desde os 35 anos de idade.


Mesmo sendo odiado por muitos e acumulando problemas de saúde mantive meu ritmo por um bom tempo. Afinal, as coisas continuavam dando certo e o sucesso financeiro e profissional é uma boa maneira de esquecer os fracassos pessoais.


Foi aí que a vida começou a me ensinar algumas coisas importantes.


O primeiro ensinamento veio da própria vida profissional. Depois de vários anos de sucesso contínuo, vieram os primeiros anos de dificuldade. As metas profissionais, antes sempre atingidas, passaram a ser um sonho impossível de atingir e a frustração de não atingi-las um pesadelo diário.


Foram alguns anos de luta intensa em busca de resultados melhores, em um projeto que parecia impossível de ser concluído. Talvez os piores e mais importantes anos de minha vida profissional e pessoal. Assim como uma chapa de metal, que sob a intensa pressão de uma prensa vai tomando novas formas, também fui sendo moldado pelas dificuldades que enfrentei.


Aos poucos fui aprendendo que gritar com as pessoas era menos efetivo do que apenas conversar. Aprendi que há coisas que não podemos mudar, não importa o quão fortes e poderosos sejamos. Aprendi também que a vida era muito mais do que o trabalho e que a família não pode ser colocada em segundo plano indefinidamente.

O aprendizado trouxe de volta alguns valores que havia deixado para trás. A vontade de estar mais próximo da família e dos amigos ficou mais forte. O prazer de observar a natureza e sentir o vento no rosto voltou a me visitar. Os momentos de reflexão sobre a vida e seu sentido passaram a ser mais freqüentes, realimentando o processo de transformação.

Hoje tenho uma vida muito diferente. Deixei a posição de executivo profissional para tocar meus próprios negócios, o que me dá muito mais prazer. Tenho tempo de ir ao Ibirapuera diariamente para caminhar e refletir sobre a vida. Passo mais tempo com a família e com os amigos.

O dinheiro, o sucesso profissional e o poder deixaram de ser meus maiores objetivos. Ao contrário, minha saúde e o relacionamento familiar são hoje minhas metas principais. No campo profissional, a realização de construir meus próprios empreendimentos superou em muito a disputa por poder que vivia nas empresas em que trabalhei.

O estresse diário e crescente foi substituído por uma tranqüilidade perene, que quase me faz esquecer como era ruim viver estressado. A preocupação e ansiedade excessiva por pequenas coisas foi substituída pela busca paciente e persistente de coisas mais importantes como o auto-conhecimento e as verdadeiras amizades.

Talvez seja esse o segredo de minha pouca preocupação com a crise econômica. Afinal, o que de importante ela pode tirar de nós?

Se você tiver comentários sobre esse ou outro artigo, escreva para paulo.pinho@uol.com.br.

Abraços,

PP

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